TCE aponta irregularidades em repasses de R$ 7,4 milhões na gestão de Raquel Lyra

Fonte: Blog do Magno
Relatório de auditoria especial do Tribunal de Contas do Estado (TCE) comprovou irregularidades em 35 termos de fomento firmados entre a Secretaria de Desenvolvimento Agrário, Agricultura, Pecuária e Pesca de Pernambuco e pelo menos 14 entidades envolvidas na realização de feiras agropecuárias. Os problemas vão desde a inexigibilidade de licitação que antecedeu as contratações até pagamentos em duplicidade. Os repasses, que somaram R$ 7,4 milhões em dois anos, passaram pelo crivo de três secretários estaduais e privilegiaram redutos eleitorais de aliados da governadora Raquel Lyra (PSD).
O caso mais emblemático, que mereceu capítulo dedicado no relatório, foi o da realização da 1ª Feira Integrada de Produtos da Agricultura Familiar (Fipagri), promovida pelo Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA), vinculado à pasta. O evento teve a finalidade de integrar produtores rurais, entidades governamentais de fomento à agricultura familiar e empresas agrícolas para divulgarem seus produtos e serviços, o que, segundo as apurações, não configurava uma atividade “de natureza singular”.
Por isso, não havia justificativa para que a escolha fosse feita sem disputa pública, apontou o relatório. Apesar disso, a Secretaria de Desenvolvimento Agrário, sob o comando da então secretária Ellen Viegas, publicou a dispensa de chamamento público em 7 de outubro de 2023 e, na sequência, celebrou um termo de fomento com o Instituto Asa Branca no valor de R$ 799.800.
A feira ocorreu 12 dias depois, na sede do IPA, no Recife. O órgão era presidido por Joaquim Neto, filiado ao PSDB, partido da governadora na época, e apoiado por ela na disputa pela Prefeitura de Gravatá em 2024.
“[A secretaria] deveria ter realizado uma licitação para a contratação de empresa com expertise em eventos/feiras para realização de serviços previstos em um termo de referência. Ou melhor, quem deveria ter realizado a licitação era o próprio IPA, que foi quem idealizou, contratou serviços e realizou a 1ª Fipagri”, afirmaram os auditores.
O relatório constatou ainda que coube ao IPA fazer contratações complementares, o que levou, inclusive, ao pagamento em duplicidade de serviços de design para criar a identidade visual do evento. A então diretora de Administração e Finanças do órgão, Sandra Carmen da Silva, é apontada como passível de responsabilização.
Joaquim Neto não é citado. Já a ex-secretária Ellen Viegas incorreu em irregularidade, segundo a auditoria, por ter firmado o termo de fomento sem realizar licitação. Parcerias celebradas por Aloísio Ferraz, antecessor de Viegas, e pelo atual secretário, Cícero Moraes, também foram apontadas como irregulares.
Segundo os auditores, o governo Raquel Lyra não conseguiu comprovar a necessidade de dispensar licitações em 20 dos 35 casos averiguados, que somaram R$ 4,6 milhões. Já 33 termos de fomento não receberam parecer técnico da Secretaria de Desenvolvimento Agrário que justificasse a contratação das entidades sem concorrência.
Cinco parcerias, com repasses totais de R$ 1,7 milhão, não passaram pelo crivo da Procuradoria-Geral do Estado (PGE). Também houve casos de omissão na prestação de contas e na instituição de uma comissão de monitoramento e avaliação dos termos de fomento, o que, segundo o TCE, demonstrou que as “falhas identificadas permeiam todo o ciclo das parcerias”, que houve um “grave descumprimento das normas legais e uma fragilidade nos controles internos da secretaria”.
Além da Fipagri, outras feiras estão na mira do TCE por irregularidades no formato do apoio financeiro fornecido pela gestão estadual. Em 2023, por exemplo, a Associação dos Criadores da Mata Norte de Pernambuco recebeu R$ 130 mil para realizar a Expo Carpina. Na época, a entidade atribuiu publicamente o êxito da parceria às articulações do deputado estadual France Hacker (PSB), que, embora filiado ao maior partido de oposição ao governo, apoia a governadora Raquel Lyra.
Em 2024, a parceria se repetiu, mas com um repasse maior, de R$ 200 mil. Outra beneficiada foi a Associação dos Produtores de Leite de São Bento do Una, no Agreste, que recebeu R$ 40 mil, em 2023, e R$ 49,5 mil, em 2024, para promover a Expoleite. A cidade é reduto eleitoral da ex-prefeita e deputada estadual Débora Almeida (PSDB), na época, líder do partido da governadora na Assembleia Legislativa (Alepe).
Na edição de 2025, a entidade beneficiada registrou nas redes sociais a participação da parlamentar no evento, ao lado da comitiva estadual, em uma espécie de disputa de forças com o grupo do prefeito Alexandre Batité (MDB), com o qual rivaliza politicamente.
O relatório da auditoria especial do TCE conclui pela responsabilização dos ex-secretários Aloísio Ferraz e Ellen Viegas e do atual secretário, Cícero Moraes. Ferraz deixou o cargo em julho de 2023. Viegas ficou na pasta de agosto daquele ano até fevereiro de 2024. Depois, acabou deslocada para a presidência do IPA e, em março deste ano, foi exonerada.
Já Moraes assumiu o cargo em fevereiro do ano passado, por indicação do Podemos. O partido também comanda o IPA. A Associação dos Criadores da Mata Norte de Pernambuco, a Associação dos Produtores de Leite de São Bento do Una e outras 12 entidades beneficiárias dos repasses não são indicadas como passíveis de responsabilização na auditoria do TCE.